Olho de Vidro
Discussões técnicas e não tão técnicas sobre cinema e vídeo digital, equipamentos, filmes.

mar
02

A série de documentários “Xingu” se embaralha à minha história pessoal e da minha família.

Em 1983, quando deixou a direção do jornal Diário da Manhã, em Goiânia, meu pai, o jornalista e documentarista Washington Novaes, foi convidado pela Intervídeo, então capitaneada por Walter Salles, Roberto D’Ávila e Fernando Barbosa Lima para conceber e dirigir uma série para a TV sobre povos indígenas brasileiros. Os altos custos e a complexa logística envolvidos levaram à opção por um objeto menos amplo, de onde a escolha pelo foco nos índios do Parque Indígena do Xingu, no Mato Grosso.

Assim, em agosto de 1984, Washington e uma equipe formada pelo fotógrafo Lula Araújo, o técnico de VT e som Antonio Gomes e o produtor José Carmo, partiu para o Parque do Xingu para um estadia de dois meses destinada a retratar inicialmente cinco etnias: Waurá, Kuikuro, Metuktire e Kren-a-Karore (que mais tarde retornaram a seu nome ancestral “Panará”).

O resultado foi a série “Xingu – A Terra Mágica”, em 11 episódios, exibida em 1985 pela extinta Rede Manchete, aclamada pelo público e pela crítica, premiada em festivais de TV pelo mundo afora e prestigiada com uma sala própria em 1986 na importante Bienal de Veneza. Alguns dos programas da série chegaram na época a atingir 20 pontos de audiência, feito inédito para a TV Manchete então e para uma série deste tipo.

Desde então, os índios passaram a fazer parte de nossa vida, sempre frequentando nossa casa, e muitos deles, ao longo do tempo, tornando-se grandes amigos.

Em 1987, Washington retornou ao Xingu. Mais uma vez em parceria com a Intervídeo, realizou a série “Kuarup – Adeus ao Chefe Malakwyauá”, que retratou um dos grandes líderes xinguanos e o Kuarup, a festa para os mortos ilustres no Xingu, que o homenageou.

Desde meados da década de 90, meu pai desejava retornar ao Parque para uma terceira série, que estabelecesse uma ponte com a série original e mostrasse as mudanças de toda sorte ocorridas desde 1984. Mas foi apenas em 2006 que o desejo pode se tornar realidade.

Com patrocínio da Petrobras e da Natura, através da Lei do Audiovisual, em mais uma parceria com a Intervídeo e desta vez também com a TV Cultura, Washington voltou a Xingu, desta vez acompanhado de boa parte de sua família, muitos de nós exercendo funções na realização do filme. Eu assumi a assistência de direção e a direção de produção de toda a série, na qual foram gastos 2 milhões de reais. João e Guilherme, meus irmãos, responderam pela Produção Executiva, junto com Cláudio Pereira e Roberto D’Ávila, da Intervídeo. Marcelo, outro irmão, fez a fotografia de still e ainda segurou a segunda câmera.

Na equipe de gravação, contamos mais uma vez com a mão tranquila de Lula Araújo. Antonio Gomes, por problemas de saúde, não pode nos acompanhar, apesar do desejo de Washington de contar com a mesma equipe, e foi substituído por Pedro Moreira.

O Lula é, para mim, um dos melhores fotógrafos de documentários do país, sobretudo em situações como as com que nos deparamos no Xingu, onde os objetos retratados não estão sob seu controle, as coisas acontecendo o tempo todo independentes da vontade de quem filma. O cara pensa e responde muito rápido, produzindo imagens comoventes mesmo nas condições mais adversas e sem nenhuma possibilidade de preparação prévia.

Foram quase 40 dias divididos entre seis aldeias. Além dos Waurá, Kuikuro, Metuktire e Panará, foram incluídos os Yawalapiti – em função do papel relevante que seu falecido chefe Paru acabou assumindo na série de 1984 – e os Kalapalo – pois este povo hospedava o Kuarup daquele ano no Parque.

Resultaram quase 100 horas de material. Depois de muita reflexão e discussão com Lula, optamos pelo HDV como formato de captação, usando duas câmeras Sony Z1. Apesar de seus problemas e de não ser propriamente um formato profissional, revelou-se adequado para as características do projeto pelo custo mais baixo, pela grande quantidade de material precioso a ser arquivado – fazer isso em formatos sem fita ainda tem suas complicações – e pelo desejo de gravar em alta definição.

Seis novos programas foram editados – um programa de abertura e mais um para cada povo (o Kuarup dos Kalapalo foi incluído no primeiro programa) – e a série antiga foi remasterizada pelos Estúdios Mega com uma nova correção de cor e eliminação de dropouts no material analógico. Somadas, as duas séries viraram uma série de 16 programas, intitulada agora “Xingu – A Terra Ameaçada” (o 11o programa de 1984/1985 era apenas uma espécie de making of da série e foi excluído da nova sequência).

A série completa foi exibia no segundo semestre de 2007 pela TV Cultura e pela TV Brasil com grande resposta do público e da crítica.

Acima, você pode conferir a bela abertura montada pelo João Paulo Carvalho – que também editara a série original – junto com a Aline Nóbrega, e também duas chamadas exibidas em TV e em salas de cinema, como parte do plano de marketing da série.

maio
14

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